Condomínio proíbe alojamento local mas tem de recuar



O Tribunal da Relação do Porto (TRP) (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 25192/16.3T8PRT.P1, de 10 de janeiro de 2019) decidiu que sem a concordância do proprietário da fração destinada a habitação e afeta a alojamento local não pode a assembleia de condóminos deliberar no sentido de proibir ou impor restrições ao uso da fração para essa finalidade.
Os proprietários de três frações autónomas de um prédio, destinadas a habitação e licenciadas para a atividade de alojamento local, recorreram a tribunal pedindo que fossem declaradas nulas ou ineficazes as deliberações da assembleia de condóminos que, por maioria, tinham vedado o acesso ao prédio a quem não fosse condómino, residente ou convidado, impedindo o uso das frações para a atividade de alojamento local.
O condomínio e os demais condóminos contestaram alegando que as frações estavam exclusivamente adstritas à função habitacional e se situavam num condomínio fechado, com piscina, sala de ginástica e bilhar, enumerando as consequências do maior afluxo de pessoas às partes comuns e pedindo para que os autores fossem condenados a cessar a exploração dos estabelecimentos de alojamento local que vinham desenvolvendo nas suas frações.
O tribunal julgou improcedente a ação, condenando os autores a cessarem a atividade de exploração de alojamento local, decisão da qual um deles recorreu para o TRP.
O TRP julgou procedente o recurso, revogando a sentença recorrida e declarando ineficazes as deliberações da assembleia geral de condóminos.
Decidiu o TRP que sem a concordância do proprietário da fração destinada a habitação e afeta a alojamento local não pode a assembleia de condóminos deliberar no sentido de proibir ou impor restrições ao uso da fração para essa finalidade.
Os conceitos de habitação e alojamento não são coincidentes. O conceito de habitação é mais amplo ou intenso. O turista é alguém que está de passagem, que se desloca para conhecer ou visitar outros locais e que vai regressar ao espaço onde tem a sua vida organizada e onde habita. Por isso, o turista não habita nos locais onde se hospeda ou aloja, ele apenas pernoita e descansa nesses locais para satisfação das suas necessidades de sono e repouso, aí guardando, durante o tempo da estadia, os bens indispensáveis à viagem que está a fazer.
Todavia, o conceito de alojamento, mais restrito, está contido no conceito de habitação, de maior abrangência. Habitar é algo mais do que apenas alojar, mas inclui todos os atos e utilidades característicos do conceito de alojar.
Nesse contexto, sendo certo que quem pode o mais deverá poder o menos, a utilização para alojamento temporário de turistas não diverge da utilização para habitação porque a pessoa alojada não pratica no local de alojamento algo que nela não pratique quem nele habita.
Acresce que as frações de alojamento local não são estabelecimentos hoteleiros que tenham de dispor de equipamentos, serviços e funcionários para receção dos turistas e prestação de outros serviços desejados pelos turistas.
Como tal, prevendo o título constitutivo da propriedade horizontal que determinada fração se destina à habitação, não existe, em princípio, impedimento a que o seu proprietário a afete a alojamento local de turistas. A circunstância desse alojamento ser prestado em regime de prestação de serviços não é bastante para afirmar que a utilização para alojamento é diversa e incompatível com a sua utilização para habitação.
Não existindo norma legal que, ao contrário do que acontece com os hostels, exija a autorização dos condóminos para a exploração de atividade de alojamento local em prédio constituído em propriedade horizontal em que coexista habitação. Nem podendo os condóminos, sem o voto favorável do condómino afetado, proibir ou impor restrições ao uso da fração para essa finalidade. Pelo que, tendo o condómino em causa votado contra as deliberações da assembleia geral, estas são quanto a ele, ineficazes, não podendo o mesmo ser obrigado a cessar a atividade de exploração de alojamento local na sua fração.